O que celebrar no equinócio de Outono?

Alban Elfed

Alban Elfed é o termo galês proposto por lolo Morganwg para o equinócio de Outono, usado ainda hoje por algumas tradições dentro do revivalismo druídico.

Na perspectiva da Roda do Ano, que equipara os ciclos naturais às fases da nossa própria vida, o equinócio de Outono aparece associado ao pôr-do-sol e à idade madura, em que se aproveita os frutos da nossa colheita pessoal.

Está também ligado ao Oeste, um lugar de passagem para o Outro Mundo. A Oeste residem as Ilhas Bem-Aventuradas dos mitos irlandeses e gregos.

Pela associação ao elemento aquático, há druidas que se referem ao Alban Elfed como “A Luz das Águas”.

(Mas… e o Mabon?)

As comunidades neopagãs começaram a dar o nome de

“Mabon” ao equinócio de outono após a publicação de um calendário criado pelo americano Aidan Kelly em 1974 (onde se encontram também pela primeira vez os nomes Ostara e Litha para falar da primavera e do verão).

Kelly inspirou-se em duas antigas celebrações outonais:

  • Os Mistérios Eleusinos da antiga Grécia, que ritualizavam o rapto e resgate de Perséfone;

  • O ano novo judaico, ou Rosh Hashanah, em que se lê a história do quase-sacrifício de Isaque pelo seu próprio pai, Abraão.

A partir daí, concluiu que o mito celta mais próximo era a história galesa de Mabon (lit. “filho divino”) ap Modron, retirado da sua mãe aos 3 dias de vida e resgatado da prisão já adulto pelo Rei Artur — com a ajuda de um salmão!

Megalitismo

A par de outros fenómenos astronómicos, sabemos que as primeiras sociedades agrícolas terão tentado calcular com precisão quando acontecia um equinócio.

Em todo o mundo podemos encontrar megalitos alinhados com o sol em dia de equinócio. Eis alguns casos europeus, todos com pelo menos 5000 anos de construção:

  • O chamado Cairn T, em Loughcrew, County Meath na Irlanda;

  • Os templos de Mnajdra, em Malta;

  • E claro, o Cromeleque dos Almendres, perto de Évora, em Portugal.

As segundas colheitas

Em irlandês, o mês de setembro dá pelo nome de Méan Fómhair, ou “A Meio da Colheita”, tal como outubro tem por nome “Deireadh Fómhair”, “O Fim da Colheita”.

No entanto, não temos evidências que nos permitam associar nenhum mito celta em particular ao equinócio de Outono.

Em todo o caso, celebrar o fim das colheitas foi motivo de festa durante séculos no Reino Unido, em particular no território da Inglaterra. Trata-se do festival de Harvest Home, “Lar da Colheita”, em que os trabalhadores dos campos eram recompensados pelos patrões com um banquete, com bastante álcool e música à mistura.

Também era costume consumir-se ganso assado em honra a São Miguel Arcanjo, cuja festividade decorre no dia 29 de setembro.

A última espiga

Entre as colheitas que decorrem no Outono, destacam-se as maçãs, cerejas, uvas e outros frutos.

Mas em várias localidades no Reino Unido, desenvolveram-se tradições específicas em torno da colheita da última espiga de trigo ou maçaroca de milho.

Era costume transformar a espiga numa espécie de boneca ou outro artefacto a que se dava os mais diversos nomes — “the Mare, the Neck, the Kern Baby” …

Nas Ilhas Hébrides, a forma como se vestia e tratava a boneca dependia da qualidade da colheita — em forma de jovem, se a colheita fosse farta, ou de velha, se fosse escassa.

”É milho-rei, milho vermelho…”

Em Portugal, claro está, não nos são estranhas as desfolhadas em busca do chamado milho-rei — a (rara) maçaroca vermelha que dava direito a abraços e beijos entre namorados na aldeia…

Ainda hoje, as vindimas e outras colheitas atraem trabalhadores temporários aos campos do país. Tal como nas festas de Harvest Home, em alguns lugares observa-se o costume das adiafas, as refeições dadas pelos patrões aos trabalhadores em sinal de agradecimento.

Na Galiza, persiste a Queima das Fachas, que terá origens pré-romanas mas cujo significado se perdeu no tempo.

Hoje em dia, aparecem ligadas às festas da natividade de Maria, a 8 de setembro.

É hora de deixar cair…

Nas atuais sociedades industrializadas do hemisfério Norte, a chegada do Outono já não significa o fim da labuta (porventura ao revés dos ciclos naturais), mas sim o regresso ao trabalho, o recomeço das aulas…

Mesmo assim, podemos reservar alguns instantes para separar o trigo do joio.

Podemos contemplar a sabedoria das árvores de folha caduca, que deixam despir do que é acessório para se preservarem durante os rigores do inverno.

Diante do poente, podemos ponderar a nossa relação com as águas, fonte de vida.

Podemos observar que a semente que dorme no solo é estrela que brilha no vazio, à espera de se revelar com o regresso do sol.

Para reflectir

  • Nestas colheitas, o que desperta a nossa gratidão?

  • O que há de mais essencial, profundo e genuíno em nós?

  • De que expectativas precisamos de nos libertar para preservar (e fazer crescer!) essa nova semente?

  • Como podemos reservar tempo para nos abrirmos ao que está além do tempo — o nosso íntimo, a ancestralidade, o divino?

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