Carta a um Jovem Místico

“Por onde começo?”

Diria que prestar atenção, ou melhor, cultivar a tua atenção, é essencial. Se não o fazes ainda, começa a meditar. Faz um exercício básico de atenção plena: toma consciência da tua respiração, foca-te num ponto entre os teus olhos, na tua testa, ou onde quer que seja mais fácil para ti.

Com o tempo, poderás querer juntar algumas questões à tua prática à medida que te acostumas mais e mais com a calma e com uma consciência mais profunda. A calma e a consciência geralmente geram-se mutuamente. Porque existe uma Presença dentro do Silêncio, e estar consciente é a forma de a encontrares.

Este encontro é feito de escuta e de demandas em partes iguais. Poder-lhe-íamos chamar “oração”. Sempre que permaneceres no Silêncio, pede que o teu caminho se manifeste; compromete-te a estar aberto e a entregares-te ao que quer que ele te possa trazer, pois qualquer caminho digno de que gastes a tua vida será seguramente a maior aventura de todas, da qual ninguém sai vivo. A verdade é que nunca chegarás a entrar na Terra Prometida. Porém, acabarás por ter um vislumbre dela vista de longe, e ficarás grato por isso.

Pede, e depois escuta.

Procura pela Presença no íntimo do Silêncio com o ardor de um amante. Bate à sua porta noite e dia, até ao último dos teus dias, quando finalmente te será dado acesso às câmaras interiores. Deixa-te devorar pelo amor pelo Silêncio, unicamente por causa do próprio Silêncio.

Lê. Lê muito, tanto aquilo que te deixa mais curioso como o que mais te incomoda, pois há enorme valor em pedras de tropeço.

Mas fica avisado de que a letra da lei, e toda a prosa, é morte. Essencialmente, o que de facto procuras é um conhecimento de todas as coisas e da própria vida que deve ser da mais íntima e da maior necessidade na tua alma; se não fosse esse o caso, não sentirias semelhante desejo de o procurar. Este é um Caminho de muitas estradas, mas a Natureza é a mestre de todos. E os poetas são os seus profetas.

Tem consciência da vida em geral. Vê todas as coisas como se estivessem em constante diálogo. Sabe que também tu fazes parte dessa conversa em andamento.

Sê compassivo, especialmente contigo mesmo. Fica sabendo que a Alma sabe sempre o que está a fazer, e que o Eu só faz o melhor que sabe. Sempre que estiveres em dúvida ou exausto, volta ao essencial: tomar consciência e prestar atenção. Vê o mundo pela primeira vez. Como um recém-nascido.

Lembra-te sempre daquilo que te fez perguntar “por onde começo?”. Isso será o que de maior e mais belo alguma vez terás no teu caminho.

As inquietações. O desejo. A necessidade de seguir viagem.