Dia 5. Os Elementos

Sobre as nossas cabeças, o Céu. À nossa volta, o Mar. E a Terra sob os nossos pés. Ao centro, o Fogo, as Águas, a Árvore dos Mundos.

Tentar sobrepor a este diagrama-base os quatro elementos aristotélicos, com ou sem a adenda do quinto elemento do Espírito, resulta tão bem ou tão mal como se fizéssemos o mesmo com os modelos egípcio, taoísta ou hindu. O que não invalida o interessante trabalho que tem sido feito com os conceitos de terra, água, ar e fogo, patente em várias tradições telúricas modernas, incluindo algumas vertentes do druidismo.

A noção que os antigos irlandeses apelidaram de dúile compreende as diversas formas concretas como a essência humana se manifesta no mundo da corporeidade. E na medida em que elas encontram espelhos, traços complementares no mundo natural exterior, na medida em que as pedras são os ossos da paisagem ou que o sangue forma mares dentro de nós, em que as árvores têm pele e o nosso rosto serve de Sol para o mundo, o nosso dúile são de facto os elementos que constroem a realidade — a nossa, porque é ao importar o mundo para o nosso íntimo que o percebemos.

Se a Natureza é, nas suas muitas manifestações e vozes, a única verdadeira mestra, é pelos sentidos que ela efectiva a nossa iniciação. São eles a ponte entre a nossa vida interior e a Vida invicta do mundo; passe a terminologia, são eles os sacramentos que conduzem à Vida profunda. Algo de assombroso acontece quando contemplamos esta natureza iniciatória do nosso corpo, quando o corpo assume o seu papel sacerdotal e tudo o que acontece, tudo o que experimentamos, prazer e dor, se transforma em alfaias da Arte. De súbito tudo se torna sagrado; e aí já não é sagrado apenas o que nos parece belo e inofensivo, mas sobretudo aquilo que não podemos controlar. Porque nada possuímos: somos mendigos diante do Caos indomável, e sob essa luz (im)portamos já tudo aquilo de que precisamos.

Agora que temos estes corpos-sacerdotes emprestados, resta-nos percorrer todos os Três Reinos, e mudar de forma sempre que as circunstâncias nos levam a descer ao abismo das águas, a voar pelos céus do pensamento ou a mergulhar as mãos na terra, até que se acenda o Fogo que um dia nos há-de gerar para uma nova existência. Dizem que foi assim que o bardo Taliesin ganhou consciência do Awen, depois de ser longamente perseguido pela deusa Cerridwen. O que, dentro do poder transformador das histórias, acaba por ser consolador. 

Afinal, se a Vida profunda nos persegue, não teremos como fugir dela para sempre.